14 de junho de 2008

O cerco ao tumor de próstata.

VEJA - 20-06-2007
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O médico carioca Mario Eisenberger, radicado nos Estados Unidos desde 1973, é hoje um dos principais nomes por trás das recentes descobertas sobre detecção e tratamento do câncer de próstata. Eisenberger é professor de oncologia e urologia do Centro de Câncer da Universidade Johns Hopkins. Durante o Congresso da Sociedade Americana de Oncologia Clínica, em Chicago, ele falou a VEJA.
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NOS ÚLTIMOS ANOS, A EFICÁCIA DO PSA, COMO INDICADOR DA PRESENÇA DE CÂNCER DE PRÓSTATA, COMEÇOU A SER QUESTIONADA PELA IMPRECISÃO DE SEUS RESULTADOS. QUAL É, AFINAL, A UTILIDADE DO PSA?
O exame tem um papel importante no acompanhamento da doença. Por meio dele, é possível monitorar a existência de metástases e a resposta do paciente ao tratamento. Mas o PSA não indica, por exemplo, quais os pacientes com risco de desenvolver tumores mais agressivos. Ele está longe de ser um marcador perfeito.
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QUAL É O GRANDE FATOR LIMITADOR DO PSA?
O PSA não é um marcador do câncer, mas um marcador da próstata. Os níveis de PSA refletem quanto desse antígeno está sendo produzido e lançado na corrente sanguínea. E, quanto maior a próstata, mais PSA é produzido. Isso causa uma enorme confusão, sobretudo entre os homens mais velhos com aumento benigno dessa glândula. Há ainda outros fatores, como inflamações ou infecções na próstata, que podem alterar as medições de PSA. Muitos pacientes com PSA normal (abaixo de 4.0) têm câncer. Em 20% deles, o PSA é menor do que 2,5. O inverso também é verdadeiro: muitos homens com PSA próximo de 10 não têm câncer nem serão diagnosticados com a doença ao longo da vida. O problema é que esses pacientes serão submetidos a biópsias desnecessárias. Além disso, em mais da metade dos homens diagnosticados com tumor, o câncer não causaria nenhum tipo de sintoma. O que acontece hoje é que muitas vezes curamos o paciente que não precisa e não curamos aquele que precisa.
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EM SE TRATANDO DE CÂNCER, NÃO É MELHOR PECAR PELO EXCESSO DO QUE PELA FALTA?
Não haveria problema com os excessos se o tratamento não tivesse efeitos adversos. No entanto, o tratamento radical, como a retirada da próstata, tem um impacto grande na qualidade de vida do paciente. O que se propõe atualmente é a observação ativa dos pacientes diagnosticados precocemente com câncer de próstata. Homens vítimas de tumores que se desenvolvem lentamente são monitorados com repetidas biópsias e exames de PSA. A escolha entre o tratamento curativo e a continuidade da observação é baseada na progressão da doença. Esse conceito é fruto da mudança de abordagem verificada nos últimos anos.
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O QUE ESTIMULOU ESSA MUDANÇA?
Os tumores diagnosticados atualmente tendem a ser muito menores e menos agressivos do que eram na década de 90, antes de o PSA se tornar rotina. Mas estimamos que entre 30% e 50% dos casos de câncer de próstata sejam tratados desnecessariamente. Não se vive para sempre. Imaginemos um câncer de progressão lenta: ele só iria causar algum problema quando o paciente chegasse aos 150 anos.
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COMO OS PACIENTES REAGEM À PROPOSTA DE APENAS OBSERVAREM A EVOLUÇÃO DO CÂNCER?
Para o médico, é algo lógico e sensato. Mas reconheço que é difícil para os pacientes saber que têm um câncer e, ainda assim, ter de esperar de seis meses a um ano para repetir os exames e biópsias de acompanhamento.
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POR CAUSA DA PRECOCIDADE NA DETECÇÃO DO CÂNCER DE PRÓSTATA, MUITOS ESPECIALISTAS ARGUMENTAM QUE O AUMENTO DA SOBREVIDA AO TUMOR, REGISTRADO NOS ÚLTIMOS ANOS, É SUPERESTIMADO. QUAL É SUA OPINIÃO A RESPEITO?
A sobrevida dos pacientes com câncer de próstata aumentou apenas na teoria, já que passamos a contar o tempo de sobrevivência ao tumor muito mais cedo. Não temos um grande estudo avaliando se a mortalidade caiu nos últimos trinta anos. Por isso, ainda não é possível falar em queda da mortalidade decorrente do mapeamento precoce do tumor. Em outras palavras, se existem menos homens morrendo de câncer de próstata hoje, ainda não sabemos. Dois estudos mundiais em andamento (um nos Estados Unidos e outro na Europa) têm por objetivo avaliar se as mortes de fato estão caindo. Eu acredito que a mortalidade deve ter caído, mas só esses trabalhos nos darão a resposta definitiva.
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